iStock
Redes sociais: a urgência da regulação e seus impactos no mundo digital
A crescente influência das redes sociais na opinião pública e nos processos democráticos exige uma abordagem cuidadosa e informada.
Em um cenário onde as redes sociais dominam a comunicação e a disseminação de informações, a questão da regulação dessas plataformas tornou-se central. Com bilhões de usuários ativos diariamente, os desafios relacionados à privacidade, segurança e desinformação são mais críticos do que nunca, e a influência crescente dessas plataformas na opinião pública e nos processos democráticos exige uma abordagem cuidadosa e informada.
Para discutir esses pontos cruciais, entrevistamos Antonio Gelfusa Junior, publicitário e especialista em redes sociais com 25 anos de experiência. Gelfusa Junior é reconhecido por sua compreensão profunda das dinâmicas digitais e seu trabalho inovador em campanhas de marketing. Sua visão sobre a necessidade urgente de regulamentação promete trazer insights valiosos para entender como podemos criar um ambiente digital mais seguro e transparente.
Nesta entrevista exclusiva para Computer Weekly Brasil, ele explora as complexidades da regulação das redes sociais, os impactos potenciais nas empresas de tecnologia e o futuro da comunicação digital.
Qual é a sua opinião sobre a recente declaração do presidente Lula em relação à regulação das redes sociais?
Foi uma fala no sentido importante de caminhar para uma regulação urgente. As redes sociais estão se tornando um ambiente com muita desinformação, mentiras e fake-news. É preciso que algo seja feito neste âmbito.
Quais são os principais desafios que o Brasil enfrenta ao tentar regular as redes sociais?
Primeiro, envolver três pilares na discussão: a sociedade (adultos, jovens, entidades educacionais, religiosas, filantrópicas, etc); a política (Congresso e o ambiente legislativo amparado pelo judiciário); e o ambiente técnico (publicitários, jornalistas, profissionais de veículos de comunicação e das plataformas digitais, agência de propaganda, influencers, etc). Após uma ampla discussão, compreender os principais problemas como as contas de usuários fake, golpes, crimes impunes de perfis sem identidade, etc.
Como você acredita que a regulação pode impactar o cotidiano dos usuários de redes sociais no Brasil?
Se conseguirmos banir perfis fake que são criados apenas com o objetivo de falar bem ou mal de determinado produtos, marca ou pessoa, já será um ótimo caminho. Um ambiente mais saudável e menos irreal trará impacto na informação de qualidade e pessoas reais, com comentários reais.
Você vê algum risco associado à regulação das redes sociais? Se sim, quais seriam esses riscos?
Não há riscos se o ambiente político, sociedade e técnico for reunido. Todo marco regulatório que é democrático e visa o aperfeiçoamento de ferramentas e padrões de mercado auxilia boas práticas. Mas repito, precisa ser algo que envolva todas as camadas no debate.
Como a desinformação nas redes sociais afeta o cenário político e social do Brasil?
Um exemplo claro é observar a enxurrada de comentários nos vídeos de candidatos à prefeitura das cidades do Brasil. Se notar, comentários positivos e negativos, muitas vezes são feitos de perfis que não existem, que não têm comprovação. Uma pessoa pode agora mesmo criar 20 contas no Instagram, colocar uma foto fake e começar a elogiar ou degradar a imagem de algum político. Se a regulação avançar para um perfil de pessoa por CPF, solicitando o comprovante de endereço (como as lojas virtuais fazem antes de você efetuar alguma compra), com certeza teremos menos mentira e menos crimes de injúria e difamação, que acontecem aos montes, todos os dias. Os prejuízos morais, educacionais e políticos são enormes.
Quais medidas específicas você acredita que poderiam ser implementadas para combater a desinformação nas redes sociais?
Regular um CPF por usuário, exigir documentação de comprovante de residência e, no caso de empresa, exigir CNPJ e certidões. Sobre desinformação, as plataformas devem aperfeiçoar os canais para receber denúncias e, com uma curadoria profissional, remover conteúdos claramente mentirosos ou criminosos. Neste mesmo setor, é preciso aperfeiçoar o combate aos perfis que comentem crimes raciais, sexuais, contra crianças, idosos, etc. Sobre contas hackeadas, os usuários precisam ter um canal oficial e ágil para a recuperação das mesmas, serviço de WhatsApp para atendimento, registro de protocolo, etc.
Como as grandes empresas de tecnologia, ou big techs, têm reagido às discussões sobre regulação no Brasil?
Elas têm faturado muito com publicidade, e é natural que grandes empresas não queiram uma mudança de “modus operandi”. Elas só vão aperfeiçoar seus serviços se houver pressão da política e do judiciário.
Existe algum exemplo internacional de regulação de redes sociais que poderia servir como modelo para o Brasil?
Existe a Lei de Serviços Digitais na Europa, que atua como forte suporte ao comércio eletrônico. E na Florida, EUA, o TikTok foi proibido para crianças abaixo de 14 anos, por conta dos prejuízos cognitivos já constatados.
Qual seria o papel das plataformas de redes sociais na implementação e cumprimento dessas regulações?
Se adequarem quanto os registros de novos usuários, ter uma política clara de recuperação de contas, exigência de documentação, políticas claras de combate à desinformação, etc.
Como garantir que a regulação não se torne uma forma de censura ou controle excessivo da informação?
Colocando a sociedade, profissionais, plataformas, políticos e judiciário no centro do processo, discutindo prós, contras e avanços possíveis. Dessa forma, um marco regulatório surge de forma democrática. Existe também uma grande diferença entre a emissão de uma opinião e cometer um crime. Existe uma enorme diferença entre uma informação checada e uma informação mentirosa (desinformação). Precisamos ressaltar que crime não é liberdade de expressão.
Qual é o impacto econômico potencial da regulação das redes sociais para as empresas de tecnologia no Brasil?
Toda regulação traz um ambiente comercial mais adequado e com possibilidade de investimentos. Veja a própria “Normas Padrão da Atividade Publicitária”, que regula as práticas no Brasil entre agências, marcas e veículos de comunicação.
De que maneira a regulação pode influenciar a inovação e o desenvolvimento tecnológico no país?
Acredito que o ambiente mais saudável naturalmente vai gerar profissionais mais comprometidos, éticos, e soluções tecnológicas que respeitem regras básicas de mercado. Ambientes que contam com regulação e normas padrão sempre são bons para o surgimento de inovação e novos negócios.
Como as pequenas e médias empresas que utilizam redes sociais para marketing e vendas podem ser afetadas por essas regulamentações?
Uma competitividade mais justa. Se perfis de empresas que aplicam golpes e/ou não contam com registro de CNPJ forem removidos, por exemplo, as demais empresas já estarão em um ambiente de concorrência mais justa, sem comercialização milagrosa de produtos por preços que visam ludibriar as pessoas para roubar dados, contas, etc.
Quais são os próximos passos que você acredita serem necessários para avançar na discussão e implementação da regulação das redes sociais no Brasil?
O projeto conhecido como PL das Fake News, do deputado Orlando Silva, já está sendo amplamente debatido. Contar com o apoio do Congresso no sentido de ouvir todas as partes seria o próximo grande passo.